Direto ao Ponto

Tratar os clientes como se todos eles fossem iguais é um dos principais erros de etendimento. É o que garante o especialista em franchising Marcelo Cherto, considerado um dos profissionais mais influentes do marketing brasileiro e autor de 12 livros, entre os quais Somos todos vencedores e como investir numa franquia... sem entrar numa fria. Marcelo é presidente do Grupo Cherto, consultoria dedicada a otimizar o desempenho de canais de vendas e redes de negócios. Na entrevista a seguir, ele defende que o cliente precisa ser surpreendido positivamente, avalia o atendimento oferecido hoje e diz que os lojistas têm muito a aprender com as empresa de alimentação.

O que conta mais quando se fala em fidelizar clientes: preço, qualidade do produto / serviço ou atendimento?

Marcelo Cherto: Não acredito em fidelidade incondicional de cliente. No máximo, um cliente tende a dar preferência a uma empresa enquanto essa oferecer e entregar o que interessa a ele, da forma como interessa a ele. O cliente nunca quer saber o que a empresa faz, quer saber o que a empresa faz por ele. Qualidade do produto ou serviço já foi diferencial. Hoje é pré-requisito. Sem isso, a empresa nem sequer entra em campo. Perde por WO. Hoje os consumidores estão cada vez mais informados e dispõem de muitas alternativas. Portanto, não dá mais para vender qualquer coisa a qualquer preço. Se bem que há clientes que compra “preço”. Mas esses não são fiéis a ninguém. Só ao preço. Cada empresa deve definir se quer, ou não, trabalhar para clientes assim. No Grupo Cherto, preferimos não ter clientes com esse perfil. Afinal, vendemos valor, não preço. Respondendo objetivamente sua pergunta, na minha visão, para elevar a chance de um cliente brindá-la com sua preferência por um tempo mais longo (talvez “para sempre”), a única coisa que uma empresa pode fazer é oferecer um atendimento fantástico, que gere uma “conexão emocional” entre o cliente e o ponto de venda. E, se tudo der certo, entre o cliente e a marca.

Quais os principais erros de atendimento no varejo?

Marcelo Cherto: O principal erro que vejo ser cometido por vendedores de lojas de todos os ramos e tipos é tratar todos os clientes como se fossem iguais, tivessem os mesmos gostos, precisassem do que estão comprando para a mesma finalidade e preferissem ser atendidos da mesma forma. Fico pasmo de entrar em lojas diferentes, num mesmo shopping, e perceber que os vendedores de todas elas me atendem da mesma forma, seguindo “os seis passos da venda perfeita”ou “as cinco atitudes de um bom vendedor”, ou coisa que o valha. Esses treinamentos padronizados de vendas que muitas lojas contratam deixam tudo meio “pasteurizado”, sem autenticidade. E autenticidade é fundamental para criar a tão necessária  “Conexão emocional”. É fundamental que o vendedor tenha sensibilidade para “ler”cada cliente (e o momento de cada cliente), entender o que cada cliente quer para  que e tratar cada um como o indivíduo que é.

O varejo investe em atendimento como deveria?

Marcelo Cherto: Sim e não. Há lojas que não dão a mínima importância ao atendimento. Em certos ramos, há quem sobreviva e até ganhe dinheiro durante anos ou décadas agindo assim. Estão aí as padarias de bairro para comprovar isso: em muitas delas, o atendimento é indecente, mas elas vivem chias mesmo assim. Por que servem a um público semicativo. Não têm clientes, têm reféns. Ou quase reféns. Afinal, ninguém quer pegar o carro e rodar quilômetros para comprar pão em outro bairro, onde poderia ter um atendimento melhor. No outro extremo, há lojas que investem um monte de dinheiro – treinando as pessoas erradas nas coisas erradas. O bom atendimento começa com uma boa definição do perfil de gente que a empresa quer ter e um processo efetivo de recrutamento e seleção. Você não pode contratar um jacaré e esperar que ele suba em árvore. Se quer um bicho que suba em árvore, deve começar contratando um macaco ou um esquilo. Há umas poucas lojas que investem do jeito certo, nas coisas certas e nas pessoas certas. Que deixam claro para quem trabalha nelas, qual o seu propósito maior e quais os seus valores. E só contratam e mantém em seus quadros gente que tem o que chamo de “espírito de servir”. Pode observar as melhores experiências de consumo que se pode testemunhar no mercado brasileiro, em geral, são propiciadas por restaurantes e bares. Entre em qualquer  das casas da Companhia Tradicional de Comércio (AStor, Pirajá, Original, Bráz Pizzaria, Lanchonete da Cidade e outras) e perceba que há muito treinamento por trás do atendimento. Mas também há um bom processo de recrutamento, seleção motivação de pessoas. E, mais importante que tudo isso, todos os que trabalham ali entendem claramente o propósito e os valores da organização. E têm valores convergentes com esse propósito e esses valores. O varejo brasileiro tem muito a aprender com as empresas de alimentação. E com varejistas de fora que fazem as coisas do jeito certo, como, por exemplo, uma Zappos.

A conduta de diretores e gerentes com seus subordinados pode influenciar o atendimento? Por quê?

Marcelo Cherto:  Uma loja tem a cara de seu dono, seu diretor e/ou seu gerente. Um funcionário que seja maltratado tenderá a tratar mal seus clientes. Um funcionário que testemunhe atitudes arrogantes por parte de um diretor ou gerente tende a agir de forma arrogante, quando lida com seus clientes. Lidar é, acima de tudo, inspirar pelo exemplo.

Qualquer pessoa pode ser um bom atendente ou é preciso ter vocação?

Marcelo Cherto: Os chineses têm um ditado com o qual estou 100% de acordo: “Quem não sabe sorrir, não pode trabalhar numa loja”. Aliás, na minha visão, quem não sabe sorrir não deveria exercer nenhuma atividade que envolva lidar com público. E se uma loja quiser que seus vendedores sorriam, precisa começar contratando como vendedores gente que sorri. E que tenha valores compatíveis com o propósito da loja. Portanto, acredito que alguém possa aprender a ser um bom atendente – desde que tenha o perfil correto, goste de servir, goste de resolver problemas e, acima de tudo, goste de gente.

É possível citar um exemplo de estratégia para transformar clientes em fãs?

Marcelo Cherto: Há uma estratégia muito simples de se traçar e muito difícil de se executar: surpreender positivamente cada cliente, entregando, além do que ele espera, algo mais, que seja relevante para ele. De forma geral, o sucesso dessa estratégia não depende do valor intrínseco desse algo mais que se entrega ao cliente, mas sim do valor que isso tem para ele.

Como o senhor vê a velha máxima que diz que o cliente sempre tem razão?

Marcelo Cherto: As pessoas que trabalham no Grupo Cherto sabem que, em nossa organização, o cliente sempre tem razão – mesmo que não tenha razão. A não ser, é óbvio, naqueles casos raríssimos em que é evidente que ele está agindo de má-fé. Por outro lado, acredito que cada empresa deve escolher que tipo de cliente quer te. E evitar todos os outros. Não dá para ser tudo para todo mundo. Trabalhando no Grupo Cherto só temos gente que é bom ter por perto. E preferimos ter como clientes pessoas e organizações que também  são assim.


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