MUDAR PARA MELHORAR

Promover mudanças de comportamento e atitude a partir da motivação e da valorização da equipe ajuda a reter talentos e gerar resultados positivos. Esta é a opinião da consultora e palestrante Adriana Medeiros, especialista em comportamento humano. “As empresas são feitas por pessoas que precisam ser valorizadas e sentir o quanto são importantes, independente do posto que ocupam”, diz. Na entrevista a seguir, Adriana – autora do recém-lançado livro O dia da mudança – dá dicas importantes para lojistas, gerentes e vendedores que desejam “sincronizar”  suas atitudes em busca de melhores resultados.

 

Quando é hora de mudar o comportamento dentro de uma empresa?

Adriana Medeiros – Uma empresa não consegue mudar se não mudar o comportamento de todo o seu pessoal. Se a empresa quer uma mudança que englobe uma positividade que leve ao crescimento pessoal de cada integrante de sua equipe, ela precisa oferecer melhorias que propiciem um clima de mudança. O colaborador precisa se sentir muito bem dentro da empresa. E isso não está relacionado somente à questão do dinheiro, da remuneração. Se o funcionário ganha um aumento de R$ 1 mil, ele vai gastar R$ 1 mil. Se ele ganha um aumento de R$ 20 mil, ele vai gastar R$ 20 mil. Portanto, não é dinheiro que gera um processo de mudança de comportamento e de atitude de um funcionário. Mas aquilo o que a empresa e seus líderes fazem para que o funcionário se sinta muito bem, feliz, motivado e valorizado para desempenhar suas tarefas. Antigamente era assim: o chefe era o chefe. O patrão mandava e o colaborador aceitava ou não, e se não estivesse interessado em cumprir aquelas ordens pedia as contas e ia embora. Hoje tem muita gente querendo entrar no mercado de trabalho. O difícil é manter alguém dentro da sua empresa. Então, oferecer a possibilidade de mudança de comportamento e de atitude não é oferecer um bom salário para o funcionário, mas proporcionar também novos conhecimentos, lazer e até treinamentos. Não aqueles treinamentos de oba-oba, aqueles treinamentos em que o funcionário vai porque é obrigado. Fica um dia inteiro rezando para que acabe logo porque é tedioso e sai de lá frustrado porque geralmente os treinamentos acontecem nos finais de semana, quando ele poderia estar com a família, aproveitando seu tempo de outra forma. Diante de tudo isso é importante ressaltar que o processo de mudança é interno em primeiro lugar, mas partindo sempre do líder da equipe. Aliás, chefe é posto. O chefe está chefe. Ele não é chefe. Agora, o líder é líder, independentemente do posto que ele ocupa dentro da empresa.

 

"É preciso oferecer melhorias que propiciem um clima de mudança. O colaborador precisa se sentir muito bem dentro da empresa. E isso não está relacionado somente à questão da remuneração"


Neste contexto, como um chefe percebe que precisa mudar seu comportamento e sua atitude para se tornar um líder?

Adriana – É muito difícil até por uma questão de ego. Ele precisa alterar alguns conceitos dele. Ele vê o outro abaixo dele, mas deve entender que o outro está ali também como um colaborador, como peça de uma grande máquina, uma pequena parte do todo. Quem atua apenas como chefe e não como um verdadeiro líder precisa trabalhar esta mudança de comportamento, partindo da observação de que ele é um colaborador da empresa tanto quanto o faxineiro ou o vendedor. Deve estar ciente que a empresa funciona por causa de todos. Ou seja, a primeira mudança para transformar um chefe em líder seria uma mudança de percepção. Eu sou chamada para dar muitas palestras para mudar a atitude dos colaboradores. Mas espere aí: como é que eu vou gerar uma mudança nos colaboradores se não é trabalhada uma mudança na base da empresa que é formada pelos líderes, pelos gestores? Eles devem prestar muita atenção nisso. A empresa investe em uma palestra que não vai gerar mudanças significativas na organização porque não envolve aqueles que são os agentes que vão provocálas. É como aquele casal em que o marido e a mulher se dão muito mal em casa mas na rua são só elogios um para o outro. Mas em casa não é assim. O “cliente” interno não está feliz. Por isso é importante trabalhar os conceitos de qualidade e de bem-estar pessoal entre todos os que estão envolvidos no dia a dia da empresa. Não é só o cliente final que deve estar satisfeito, mas também o seu colega que está ali, ao seu lado, buscando os mesmos resultados, as mesmas metas. Desta forma tudo funciona bem. Eu gosto de destacar que as empresas não são feitas de máquinas. É feita de pessoas que precisam ser valorizadas. Precisam sentir o quanto são importantes, independentemente do posto que ocupam.


É possível desenvolver esta capacidade
de detectar a necessidade de mudar para que outros também mudem?

Adriana – A mudança acontece em nível pessoal. Você só muda o mundo se você mudar. O mais difícil é “quebrar” este conceito de chefe “não líder”, fazer ele enxergar que precisa mudar. Todo mundo quer mudar todo mundo, mas não quer mudar a si mesmo. É como você criticar a casa de alguém. É mais fácil criticar a casa de alguém do que limpar e deixar a sua casa organizada. Eu costumo dizer que uma pessoa respeitada pelo medo é o chefe. Uma pessoa respeitada pelo amor é o líder. O chefe precisa perceber o quanto ele é amado ou não e qual é a reação das pessoas em relação a ele. Não existe coisa pior do que ser respeitado por medo. No momento em que ele deixa de “estar” chefe, certamente será pisoteado. O ser humano é assim. Enquanto o funcionário estiver subordinado a um chefe que ele não gosta, ele respeita por medo. Mas quando o chefe cai, o funcionário passa por cima, o que é até natural porque a mágoa pela forma como foi tratado é grande. Por isso é que os chefes devem procurar adotar uma postura de líder e aprender a perceber a reação dos colaboradores diante do que lhes é pedido. Dependendo da reação, o gestor vai saber se precisa mudar ou não o seu comportamento.


"É muito fácil cobrar do funcionário de uma maneira agressiva, com foco totalmente voltado para as falhas. Em vez de fazer assim, por que não focar nas qualidades deste profissional?"

 

O gestor pode antecipar a necessidade de mudança ou isto é despertado apenas quando um fator ocorre dentro da empresa, como a saída repentina de bons funcionários ou a queda brusca nos resultados mensais?

Adriana – É difícil. É muito complexa a mudança. Por exemplo, nas minhas palestras, eu trabalho muito a questão comportamental e consequentemente a parte motivacional, a representação que cada colaborador possui dentro da empresa. Isto faz a pessoa caminhar melhor dentro da empresa. Eu não acredito, por exemplo, que faça diferença no trabalho de uma empresa ficar dizendo “vamos lá, vamos ser campeões, vamos ganhar dinheiro para comprar uma casa, um carro novo”. Eu acredito em fazer o colaborador se sentir bem, se sentir feliz no cargo que ocupa porque faz bem feito, dando o seu melhor. Consequentemente, o outro estará contente. O dono ou o gestor deve estar ciente dos valores que a empresa procura seguir. Ter valores é o que fundamenta a vida. Amizade, lealdade, honra, honestidade... Se você trabalha estes “temperos” de maneira congruente, sabendo quem você é e o que você quer na empresa, você vai mudar as pessoas à sua volta porque você está mudando. As pessoas começam a notar o que você tem para dar e querem dar de volta. Nas palestras, as pessoas me perguntam: quero ser feliz, o que eu faço? Primeiro, comece a fazer o outro feliz. Comece a exercitar este comportamento.


Este seria um comportamento “contagiante” que pode motivar outras mudanças?

Adriana – É possível, mas a mudança deve vir de dentro de cada um. Por exemplo, é muito fácil cobrar do funcionário de uma maneira agressiva, com foco totalmente voltado para as falhas. Em vez de fazer assim, por que não focar nas qualidades deste profissional? “João, seu trabalho é excelente, você sempre trabalhou muito bem, mas o que houve neste mês para que baixasse sua cota de vendas?” O que acontece quando a abordagem ocorre desta forma? A pessoa se sente lisonjeada, valorizada porque não é elogio pelo elogio. É uma abordagem que deixa claro para o funcionário que ele é importante para o trabalho do gerente, para o bom desempenho da loja. A mensagem é: eu quero investir em você. É importante saber se ele está com algum tipo de problema até para ajudá-lo – o que será possível se a abordagem for desta forma acolhedora e não agressiva, com uma cobrança pura e simples. Não dá para apontar só a ferida. Isto é ruim. Não tiro o direito do chefe ou do líder chamar atenção do funcionário. Não é uma anarquia onde cada um faz e age como bem entende. A questão é como a atenção é chamada. É aquela velha questão que a maioria das pessoas esquece e não pratica: faça pelo próximo o que você gostaria que fizessem por você. Como o líder quer ser tratado? Principalmente os colaboradores querem ser tratados de forma igual aos gestores. Até porque eles, na hierarquia, estão numa posição inferior e acabam se sentindo menores. Só que eles esquecem que são eles que carregam a empresa. São eles que fazem a empresa funcionar.

 

"A gente não aprende só ouvindo. A gente aprende vendo. As pessoas podem não acreditar naquilo que um líder diz, mas certamente acreditam naquilo que ele faz"


A partir da sua experiência como palestrante, no contato com as empresas do varejo, o processo de seleção de pessoal consegue detectar se o futuro empregado é mais ou menos aberto a sugestões de mudanças em seu comportamento?

Adriana – Isto depende muito da forma como trabalha o RH da empresa. Depende da percepção do profissional da área de gestão de pessoal. Mas não é difícil de saber. Você percebe isso fazendo. A gente não aprende só ouvindo. A gente aprende vendo. As pessoas podem não acreditar naquilo que um líder diz, mas certamente acreditam naquilo que ele faz. Por isso o líder tem que mostrar a forma como as questões da empresa, incluindo a necessidade de mudança e a percepção de que é preciso mudar, devem passar por algum tipo de transformação. Dependendo do perfil do funcionário, o líder poderá moldálo para atender ao tipo de comportamento que se pretende ser o padrão  na empresa não só dizendo, mas sim mostrando, fazendo. Um exemplo simples desta situação: o gerente não pode pedir de forma agressiva para o vendedor tratar bem o cliente. Fica confuso, compreende? Por isso volto a destacar a importância da liderança pelo exemplo e também do trabalho de mudança começar na base junto aos donos e aos gestores.


Por mais contraditório que pareça, adotar uma abordagem mais de líder e menos de chefe seria o maior medo para uma mudança no comportamento de quem comanda uma organização? Há um receio de perder o “poder de mandar”?

Adriana – Sim, por uma questão de crença, este seria o maior medo. O chefe pensa que não “pode baixar sua guarda” porque isso seria mostrar sua fragilidade – entendendo baixar a guarda como uma abordagem menos agressiva e muito mais proativa, atenciosa e educada. Atenção e educação são sinônimo de força, nunca de fragilidade. Fragilidade eu acredito que venha da agressividade. O líder tem que prestar atenção. Observar sem receio de mostrar suas fraquezas.


Isso vale também no relacionamento externo? Ou seja, com o consumidor final da empresa?

Adriana – Totalmente. É uma “rodaviva”. O funcionário está numa empresa onde ele é bem tratado. Sendo bem tratado, ele se sente bem. Se ele se sente bem, certamente fará seu trabalho de um jeito melhor. Fazendo melhor, a empresa cresce e o funcionário também cresce, fica feliz. E o funcionário feliz vai tratar muito bem o cliente. É uma questão de valores. É como eu coloco nas minhas palestras: as notas de R$ 100,00 e R$ 2,00 têm o mesmo tamanho, praticamente a mesma cor. O que as diferencia? O valor. No caso do atendimento, é o valor que o vendedor tem para oferecer para o cliente. O valor está dentro dele. Se ele tratar mal um cliente, é  porque é isso o que ele tem dentro dele. Se ele tratar bem, é porque é isso o que ele tem dentro dele. Cada um dá aquilo que tem.

 

"A grande questão da venda é a comunicação. O vendedor precisa conhecer muito bem o produto que a loja comercializa. E lembrar que a venda é um momento de grande felicidade para o cliente"


Este comportamento do vendedor, baseado em valores, seria essencial na abordagem do cliente que pela primeira vez entra na loja? Pode ajudar a “desmontar” o comportamento do cliente que pode ser retraído ou até mesmo agressivo, arrogante?

Adriana – Exatamente. A grande questão da venda é a comunicação. O vendedor precisa conhecer muito bem o produto que a loja comercializa. E lembrar que a venda é um momento de grande felicidade para o cliente. Um carro, uma joia, uma calça, um sapato, não importa. A pessoa não está comprando por infelicidade. Isso significa dizer que o vendedor não está vendendo um produto. Ele está vendendo alegria, bem-estar... É isso que o cliente quer inconscientemente e é isso que o vendedor deve saber conscientemente. E você não pode empurrar felicidade ou qualquer outro sentimento para ninguém. Você pode levar o camelo até o rio, mas é ele quem vai decidir se bebe água ou não. Da mesma forma, é o vendedor que mostra o caminho da felicidade para o cliente através da venda de um produto. Vai depender da abordagem dele – que deve ser simpática, generosa, conhecendo muito bem o produto, sem forçar a barra – para que se alcance o objetivo de ambos: a venda e a compra. Neste sentido, cabe lembrar que se o vendedor atender 200 pessoas num dia, a última deve ser tratada da mesma forma que a primeira e merece o mesmo atendimento lá do começo do dia, ainda que possa estar cansado ou desgastado pela rotina do dia a dia.


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